O
GAGO
Duas das boas e extraordinárias coisas
oferecidas por São Joaquim são seu clima de verão e a hospitalidade dos seus
cidadãos.
A vegetação dos campos, totalmente verde, é
um convite a passeios, churrascos, trilhas, pescarias e acampamentos à beira dos
rios, principalmente do Rio Pelotas que divide o município e o Estado de Santa
Catarina e Rio Grande do Sul.
Os habitantes da região são extremamente
hospitaleiros, personificando o lema “São
Joaquim, altivo e hospitaleiro”.
Na década de setenta eu morava lá. Lacy, meu cunhado, vendedor de tratores agrícolas, também
lá residia.
Em razão de seu trabalho, Lacy
era muito conhecido e gozava de grande estima junto aos fazendeiros da região,
recebendo freqüentes convites para festas, churrascos e outros eventos. Era
tratado por todos como gente de casa, principalmente em razão de seu espírito
gozador e bonachão.
Num último dia de ano, se não me engano,
1976, Lacy nos convidou para acampar às margens do Rio Pelotas, no distrito de São João do
Pelotas, na fazenda de um amigo dele.
Estavamos ultimando os
preparativos para sairmos quando chegou o Linésio,
com a mulher grávida e um filho pequeno.
Como estávamos prontos para sair para o
acampamento, inclusive o avô dos meus filhos, o Linésio,
que para acampar não se faz de rogado, acompanhou-nos prazerosamente.
Partimos pela estrada de chão batido, rumo ao
sul.
As estradas de sítio são bastante precárias e
são freqüentes as porteiras, cancelas e colchetes, principalmente nas divisas
entre um sítio e outro já que a atividade principal da região é a pecuária e o
gado é criado solto nos campos.
Existe, porém, um costume bastante gentil
entre os moradores locais que é o de abrir as porteiras,
quando se aproxima algum veículo.
Os agradecimentos, acompanhados geralmente
por comentários alegres, são feitos em voz alta suficiente para superar o ronco
dos carros.
Numa dessas porteiras, um rapagote
de uns doze anos, abriu-a.
Como não tínhamos certeza se estávamos na
estrada certa, Lacy perguntou-lhe se aquela era a
estrada que conduzia à fazenda onde iríamos acampar.
O garoto tentou explicar, mas como era
extremamente gago, não conseguimos entender o que ele queria dizer e Lacy, brincalhão como sempre, gritou para o rapaz:
- Patinando, hein, companheiro!?
- Vai tomá no cu,
filho da puta!
A gagueira desapareceu como por encanto.
Nem deu para ver se o rapaz não gostou.
A gargalhada foi estrondosa e a história,
sempre que lembrada, ainda provoca gostosas gargalhadas e lembranças daqueles
tempos felizes.