ESTATUTO DO IDOSO - Em 1986 sofri um acidente de automóvel e a recuperação foi muito demorada, agravada ainda pela impossibilidade de fazer hidroterapia, impedido que fui pelo médico-chefe do DEASP do Banco do Brasil, que, apesar da advertência do médico que me tratava, suspendeu minha licença para tratamento de saúde, obrigando-me a voltar ao trabalho no Banco, mesmo sem estar curado.
Aposentei-me em 1990, por tempo de serviço e desde então minha locomoção ficou cada vez mais difícil. Hoje estou com duas muletas e uma cadeira de rodas e 61 anos de idade.
Fiquei muito feliz com o Estatuto do Idoso.
Pensei:
"Agora as coisas vão ficar mais fáceis"
Puro engano!
Como, além de produzir minhas obras de arte, gosto muito de ler, em fevereiro, fui ao único lugar mais acessível a um deficiente físico para adquirir livros, um sebo, em São José, na Grande Florianópolis.
Fui até lá depois das 18 horas para não atrapalhar o trânsito, já que teria que estacionar em local proibido para poder falar com o dono da loja de dentro do carro e ele trazer os livros para eu verificar e escolher.
Assim que estacionei, ainda dentro do carro e sem ter podido sequer ver um livro, um policial já chegou:
- O senhor não está vendo o sinal? - gritou.
- Estou sim, mas eu não posso andar (mostrei-lhe um par de muletas no banco de trás) e quero comprar uns livros...
- É, mas aquj não pode estacionar! O senhor vai ter que sair, ou vou autua-lo.
- E como é que eu vou comprar um livro?
- Mande outra pessoa comprar para o senhor. Aqui não pode estacionar. Além do mais, o senhor está atrapalhando a passagem dos pedestres.
- E os meus direitos como deficiente e idoso? Por que não há estacionamento para nenhum dos dois aqui?
- Isso não é comigo. O senhor tem que sair daqui.
Saí
Sem comprar livro algum. Até chorei, de vergonha e raiva.
Um policial, provavelmente analfabeto (deve ter o segundo grau oficial), decide que eu tenho que mandar outra pessoa comprar um livro. Para ele, um livro é como um quilo de feijão: qualquer um pode comprar, cozinhar e você come
Tenho observado algumas coisas interessantes no cuidado que as autoridades têm com os deficientes e idosos:
Em Florianópolis, por exemplo, há duas vagas para deficientes físicos, do outro lado de uma rua de intenso movimento. O deficiente que se vire para atravessar a rua e chegar até onde estão estacionados carros de pessoas sãs.
Em Biguaçu, o estacionamento exclusivo do INSS para deficientes, fica do outro lado de uma rua de mão dupla; na frente do prédio, o estacionamento é para a administração do INSS.
Por que acontece isto?
Porque os encarregados da disposição dos estacionamentos, só pensam nos próprios interesses e sequer sabem o que é um deficiente físico.
As rampas, então, são um verdadeiro descalabro.
Por que o idiota que as manda fazer não experimenta sentar numa cadeira de rodas e subir por uma dessas rampas?
E os consultórios médicos? Algum deficiente pode adentrá-los? Na maioria, não.
Com o Estatuto do Idoso, isto vai mudar?
Não vai, porque as pessoas não mudaram e você, deficiente ou velho como eu, vai continuar a ser desrespeitado.
(04.03.2004)